Um dos livros mais curiosos que li nos últimos tempos. Descrevendo com grande cuidado o progresso de Abu Dhabi na segunda metade do séc. XX, Mohammed Al-Fahim escreve na primeira pessoa revelando a absoluta miséria do seu povo até aos anos 60 e a rápida ascensão do Emirado até se tornar numa das mais ricas cidades do mundo.
Al Fahim não é um escritor ou um historiador, mas é filho de um dos conselheiros do fundador dos Emirados Árabes Unidos, Sheikh Zayed, e conhecido empresário local. O seu conhecimento é acima de tudo um testemunho que deveria ser complementado por muitos outros. Infelizmente para nós, que conhecemos e gostamos de Abu Dhabi, não existem muito mais livros escritos sobre essa época e praticamente nada se sabe sobre o que se terá passado antes do início do séc. XX. A excepção são alguns documentos das potências estrangeiras (em especial o Reino Unido) e relatos dos seus navegadores e viajantes.
Onde hoje existe uma cidade de 2.5 milhões de pessoas, no início dos anos 60 do século passado viviam menos de duas mil. Sem acesso a água potável a população bebia água do mar que era naturalmente (mal) filtrada pela própria areia e recolhida em poços dentro da ilha de Abu Dhabi. Durante os meses de maior calor, a população aumentava consideravelmente para se dedicar ao que era a única actividade económica digna de registo: pérolas. Este árduo trabalho consistia em passar 10 a 12 horas por dia a mergulhar para apanhar ostras no fundo do mar para recuperar as suas pérolas durante meses a fio. Os barcos eram pequenos e inseguros e mantinham-se no mar durante toda a temporada. Uma pequena indústria de barcos de transporte de víveres levava os bens mais essenciais até às frotas. Na ilha não existiam quaisquer edifícios, apenas as cabanas de "barasti" (folha de palma) onde a população vivia, sem acesso a electricidade, água corrente, esgotos ou qualquer outra das comodidades já comuns em tantos lugares do mundo.
Finalizada a época das pérolas, grande parte da população mudava-se para Al Ain, um oásis no interior do Emirado (hoje a segunda maior cidade) onde existia água fresca e alguma agricultura e pecuária. A viagem (que hoje fazemos em pouco mais de uma hora) durava então cerca de uma semana e cobrava a vida de muitos dos mais velhos e mais novos.
O livro é verdadeiramente fascinante e obrigou-me a olhar para os Emiratis de uma forma renovada. Olho para os meus colegas e imagino o que os seus pais e avós sofreram e a velocidade a que tiveram que se adaptar quando a enxurrada de petro-dólares chegou. Como ponto fraco deste livro, apenas o facto de este ser apenas um testemunho e um ponto de vista. Seria interessante ter outras vozes a contarem as suas experiências dessa época para ajudar a completar a história desses tempos.
Se não era já óbvio, aconselho "From Rags to Riches, A Story of Abu Dhabi" vivamente a todos os que residem e trabalham em Abu Dhabi e Dubai, assim como aos que mostram interesse pela história do Golfo Pérsico e destes pobres povos nómadas que no tempo de vida de uma pessoa se tornaram na mais rica cidade do globo.