segunda-feira, 27 de agosto de 2012

The Syrian army would like to appear squeaky clean. It isn't

Mais um artigo de Robert Fisk na sua coluna do The Independent sobre a guerra civil Síria. As atrocidades sucedem-se de ambos os lados mostrando o lado verdadeiramente sujo de todas as guerras. Numa altura em que o conflito se arrasta e começa a atravessar fronteiras, com escaramuças no Iraque, Líbano e Turquia, todas as partes procuram mostrar que são o "lado limpo", mas o que a realidade é que na guerra, ninguém é limpo. Nunca ninguém é limpo. E quando não podem sujar as mãos, arranjam outros que os façam em seu nome.

The Syrian army would like to appear squeaky clean. It isn't.

"Our own beloved Free Syria Army has actually advertised its own murders on YouTube"
 
Every day, a new massacre is reported in Syria. Yesterday, it was Daraya. Slaughter by Syrian troops, according to those opposed to Bashar al-Assad. Slaughter by Bashar's "terrorist" opponents, the Syrian army said, producing the wife of a soldier whom they said had been shot and left for dead in a Daraya graveyard.

Of course, all armies want to stay clean. All that gold braid, all those battle honours, all that parade-ground semper fi. Thank God for Our Boys. Trouble is that when they go to war, armies ally themselves to the most unsavoury militias, gunmen, reservists, killers and mass murderers, often local vigilante groups who invariably contaminate the men in smart uniforms and high falutin' traditions, until the generals and colonels have to re-invent themselves and their history.
Take the Syrian army. It kills civilians but claims to take every care to avoid "collateral damage". The Israelis say the same. The Brits say the same, the Americans and French. And of course, when an insurgent group – the Free Syrian Army or Salafists – set up positions in the cities and towns of Syria, government forces open fire on them, kill civilians, thousands of refugees cross the border and CNN reports – as it did on Friday night – that refugees cursed Bashar al-Assad as they fled their homes.

And I cannot forget how Al Jazeera, loathed by Bashar now as it was once hated by Saddam, came back from Basra in 2003 with terrifying footage of dead and wounded Iraqi women and children who had been shredded by British artillery firing at the Iraqi army. And we don't need to mention all those Afghan wedding parties and innocent tribal villages pulverised by US gunfire and jets and drones.

The Syrian military, whether it admits it or not – and I'm not happy with the replies I got from Syrian officers on the subject last week – work with the shabiha (or "village defenders" as one soldier called them), who are a murderous, largely Alawite rabble who have slaughtered hundreds of Sunni civilians. Maybe the International Court in the Hague will one day name Syrian soldiers responsible for such crimes – be sure they won't touch the West's warriors – but it will be impossible for the Syrian army to write the shabiha out of the history of their war against the "terrorists", "armed groups", Free Syria Army and al-Qa'ida.

The attempted disconnect has already begun. Syrian troops are fighting at the request of their people to defend their country. The shabiha have nothing to do with them. And I have to say – and no, yet again, I am not comparing Bashar with Hitler or the Syrian conflict with the Second World War – that the German Wehrmacht tried to play the same narrative game in 1944 and 1945 and, then, in a much bigger way, in post-war Europe. The disciplined lads of the Wehrmacht never indulged in war crimes or genocide against the Jews in Russia, Ukraine or the Baltic states or Poland or Yugoslavia. No, it was those damned SS criminals or the Einsatzgruppen or the Ukrainian militia or the Lithuanian paramilitary police or the proto-Nazi Ustashe who besmirched the good name of Germany. Bulls***, of course, though German historians who set out to prove the criminality of the Wehrmacht still face abuse.

The Vichy French army tried to clean its claws by claiming that all atrocities were committed by the "Milice", while the Italians blamed it all on the Germans. The Americans used the vilest criminal gangs in Vietnam, the French used colonial troops to massacre insurgents in Algeria. The Brits tolerated the B Specials in Northern Ireland until they invented the Ulster Defence Regiment (UDR), which got contaminated by sectarian killings and was disbanded. No, the UDR was squeaky clean compared to the Germans. But at the height of their Iraqi occupation war, the Americans were paying Sunni "neighbourhood guards" to liquidate their Shia enemies, and paying thug-like reservists – along with quite a few professionals – to torture their prisoners in Abu Ghraib. And then there is Israel – forced to grovel when their own Lebanese Phalangist militia slaughtered 1,700 Palestinians in 1982. Their equally vicious South Lebanon Army militia tortured prisoners with electricity in the Khiam prison inside Israel's occupied zone in southern Lebanon.

Of course, war stains all who take part in it. Wellington's men in the Peninsula Wars could no more prevent their Spanish guerrilla allies committing atrocities than the Brits and Americans could prevent their Soviet allies raping five million German women in 1945. Didn't the Turkish army use its own version of the SS – along with Kurdish militia – to help in the genocide of the Armenians in 1915?

The Allies of the Second World War did their share of extrajudicial executions – though on nothing like the scale of their enemies – and, thanks to YouTube, our very own beloved Free Syria Army has actually advertised its own murders in Syria. Chucking policemen off roofs and shooting shabiha to death after torturing them doesn't burnish the reputations of La Clinton or the messieurs Fabius and Hague. Keeping clean is a dirty business. 

(Fonte: The Independent)

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Noite

Book Review

Escrito por Elie Wiesel e publicado em Portugal pela Texto, "Noite" conta como este judeu romeno foi atirado para o horror dos campos de concentração nazis de Auschwitz e Buchenwald ainda adolescente.

Como todos os testemunhos reais sobre o holocausto, o livro é impressionante, comovente e assustador. Apetece-nos gritar às personagens para que fujam antes que seja tarde demais. Para que não acreditem que tudo vai correr bem. Mas infelizmente não nos ouvem. Não trazendo nada de completamente diferente de outras descrições como a Primo Levi ou mesmo a versão cinematográfica de "A Lista de Schindler" de Spielberg, não deixa de ser um testemunho relevante e que deve ser lembrado.

Sinceramente o que me estragou o livro é saber mais sobre quem é realmente Elie Wiesel. Página a página, perguntava-me continuamente como é que alguém que passou por tudo isto consegue ser tão frio em relação ao sofrimento dos outros. Este mesmo homem é incapaz de dizer uma palavra quando se fala da expulsão de centenas de milhares de palestinianos, resumindo o problema à seguinte frase:

"Para mim, como judeu, Jerusalém está acima da política. Ela pertence ao povo judeu e é muito mais do que uma cidade. É o que liga um judeu a todos os outros de uma forma que é difícil de explicar"[1].

Wiesel mostra um fundamentalismo religioso perigoso, onde o sofrimento do povo judeu deve ser relembrado por todos, mas qualquer mal causado por um judeu não pode ser recordado.

Piora a sua argumentação usando a cartada religiosa: "[Jerusalém] está mencionada nas escrituras [judaicas] mais de 600 vezes e nem uma vez no Corão"[2].

Ou seja, para Wiesel, a diplomacia internacional deve ser baseada nos livros sagrados. Por algum motivo, não nos diz quantas vezes Jerusalém aparece no Novo Testamento. É que utilizando o mesmo argumento, então provavelmente Jerusalém deveria ser a capital de um estado cristão, e não de Israel.

Wiesel, prémio Nobel da Paz em 1986, utiliza o seu sofrimento e o dos seus para se colocar num patamar diferente de todos os outros. Em vez de lutar para que estes crimes desapareçam todos de vez da face da terra, usa-os para ignorar todos os outros. Inclusivé o dos milhões de deficientes mentais, ciganos, polacos, russos, comunistas, sociais democratas e todos os que cairam nas garras no regime nazi. E isso estraga o livro. Não o seu conteúdo, mas a sua utilização para fins ilícitos.

A Indústria do Holocausto

Book Review

Já ouvira que Norman Finkelstein era um radical[1], um self hating jew[2] entre muitos outros insultos. Conhecia o ódio de que é alvo por parte dos lóbis judeus americanos. Já estava por isso preparado para ouvir algo de diferente da boca deste americano, filho de sobreviventes do holocausto nazi e promotor feroz da independência da Palestina e dos direitos humanos nos territórios ocupados. Mesmo assim, nada me tinha preparado para o que iria encontrar neste livro.

Publicado em Portugal pela Antígona, "A Indústria do Holocausto - Reflexões sobre a exploração do sofrimento dos judeus" pega num estudo de Peter Novick "The Holocaust in American Life" e leva-o mais longe, transformando-o numa acusação directa à Indústria do Holocausto que Finkelstein distingue do verdadeiro e factual holocausto nazi. Este último refere-se aos milhões de pessoas que foram assassinadas de forma sistemática pelo regime Nazi enquanto o primeiro é não mais do que a forma como essa memória tem sido utilizada para extorquir dinheiro e influência para um conjunto de instituições.

Historicamente o holocausto foi esquecido durante décadas. Os filmes e a literatura dos anos 40, 50 e 60 do século passado ingnoram a sua existência embora toda a gente tivesse conhecimento do que acontecera. Só depois da guerra dos 6 dias em 1967, é que os judeus americanos, nesse momento de força inequívoca do estado de Israel em relação aos seus vizinhos, descobrem Israel. Subitamente a própria sobrevivência do Estado de Israel era gritada aos ventos e os sobreviventes do holocausto estavam a passar enormes dificuldades. Com estes argumentos iniciou-se um processo de dupla extorsão: por um lado o lóbi judeu americano usou a sua influência junto dos governadores, congressistas e senadores americanos para forçar países como a Suíça, a Alemanha e a Polónia a pagarem indemnizações pelos eventos da segunda guerra mundial (mesmo quando em alguns casos já se tinha chegado a acordos e pago os mesmos imediatamente a seguir à guerra). Por outro, esse dinheiro, em grande parte, não chegou efectivamente aos sobreviventes e familiares das vítimas dos campos de extermínio nazis espalhados pelos vários países ocupados para além da própria Alemanha.

Finkelstein defende de forma clara que a ideia de que o extermínio dos judeus pelo regime Nazi não deve ser colocado numa categoria à parte. Embora seja um crime enorme e hediondo, não é único e as regras que aplicamos para procurar justiça para este deve ser utilizado também para outros. Seja o holocausto arménio, a escravatura em todo o mundo, a limpeza étnica dos palestinianos entre outros. Também o extermínio de ciganos e doentes mentais (os outros dois grupos sociais alvo dos nazis) durante o mesmo holocausto nazi deve ser tratado da mesma forma. E levanta ainda a questão de extremo mau gosto de o governo americano financiar inúmeros museus do holocausto e pergunta "o que aconteceria se a Alemanha fizesse um sem número de museus a demonstrar a escravatura dos negros nos EUA ou a limpeza étnica dos nativos americanos?".

Um livro provocador, bem escrito e corajoso de um homem que não se deixa silenciar. E ainda bem que é judeu, porque qualquer outra pessoa que trouxesse os mesmos argumentos seria simplesmente atirada para um canto e esquecido debaixo do argumento de "anti-semita".

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Syrian war of lies and hypocrisy

Artigo de Robert Fisk, no "The Independent" sobre a hipocrisia e as mentiras que rodeiam a guerra civil síria. Simplesmente brilhante.

Robert Fisk: Syrian war of lies and hypocrisy

The West's real target here is not Assad's brutal regime but his ally, Iran, and its chemical weapons

Robert Fisk - The Independent
Has there ever been a Middle Eastern war of such hypocrisy? A war of such cowardice and such mean morality, of such false rhetoric and such public humiliation? I'm not talking about the physical victims of the Syrian tragedy. I'm referring to the utter lies and mendacity of our masters and our own public opinion – eastern as well as western – in response to the slaughter, a vicious pantomime more worthy of Swiftian satire than Tolstoy or Shakespeare.

While Qatar and Saudi Arabia arm and fund the rebels of Syria to overthrow Bashar al-Assad's Alawite/Shia-Baathist dictatorship, Washington mutters not a word of criticism against them. President Barack Obama and his Secretary of State, Hillary Clinton, say they want a democracy in Syria. But Qatar is an autocracy and Saudi Arabia is among the most pernicious of caliphate-kingly-dictatorships in the Arab world. Rulers of both states inherit power from their families – just as Bashar has done – and Saudi Arabia is an ally of the Salafist-Wahabi rebels in Syria, just as it was the most fervent supporter of the medieval Taliban during Afghanistan's dark ages.

Indeed, 15 of the 19 hijacker-mass murderers of 11 September, 2001, came from Saudi Arabia – after which, of course, we bombed Afghanistan. The Saudis are repressing their own Shia minority just as they now wish to destroy the Alawite-Shia minority of Syria. And we believe Saudi Arabia wants to set up a democracy in Syria?

Then we have the Shia Hezbollah party/militia in Lebanon, right hand of Shia Iran and supporter of Bashar al-Assad's regime. For 30 years, Hezbollah has defended the oppressed Shias of southern Lebanon against Israeli aggression. They have presented themselves as the defenders of Palestinian rights in the West Bank and Gaza. But faced with the slow collapse of their ruthless ally in Syria, they have lost their tongue. Not a word have they uttered – nor their princely Sayed Hassan Nasrallah – about the rape and mass murder of Syrian civilians by Bashar's soldiers and "Shabiha" militia.

Then we have the heroes of America – La Clinton, the Defence Secretary Leon Panetta, and Obama himself. Clinton issues a "stern warning" to Assad. Panetta – the same man who repeated to the last US forces in Iraq that old lie about Saddam's connection to 9/11 – announces that things are "spiralling out of control" in Syria. They have been doing that for at least six months. Has he just realised? And then Obama told us last week that "given the regime's stockpile of chemical weapons, we will continue to make it clear to Assad … that the world is watching". Now, was it not a County Cork newspaper called the Skibbereen Eagle, fearful of Russia's designs on China, which declared that it was "keeping an eye … on the Tsar of Russia"? Now it is Obama's turn to emphasise how little clout he has in the mighty conflicts of the world. How Bashar must be shaking in his boots.

But what US administration would really want to see Bashar's atrocious archives of torture opened to our gaze? Why, only a few years ago, the Bush administration was sending Muslims to Damascus for Bashar's torturers to tear their fingernails out for information, imprisoned at the US government's request in the very hell-hole which Syrian rebels blew to bits last week. Western embassies dutifully supplied the prisoners' tormentors with questions for the victims. Bashar, you see, was our baby.

Then there's that neighbouring country which owes us so much gratitude: Iraq. Last week, it suffered in one day 29 bombing attacks in 19 cities, killing 111 civilian and wounding another 235. The same day, Syria's bloodbath consumed about the same number of innocents. But Iraq was "down the page" from Syria, buried "below the fold", as we journalists say; because, of course, we gave freedom to Iraq, Jeffersonian democracy, etc, etc, didn't we? So this slaughter to the east of Syria didn't have quite the same impact, did it? Nothing we did in 2003 led to Iraq's suffering today. Right?

And talking of journalism, who in BBC World News decided that even the preparations for the Olympics should take precedence all last week over Syrian outrages? British newspapers and the BBC in Britain will naturally lead with the Olympics as a local story. But in a lamentable decision, the BBC – broadcasting "world" news to the world – also decided that the passage of the Olympic flame was more important than dying Syrian children, even when it has its own courageous reporter sending his despatches directly from Aleppo.

Then, of course, there's us, our dear liberal selves who are so quick to fill the streets of London in protest at the Israeli slaughter of Palestinians. Rightly so, of course. When our political leaders are happy to condemn Arabs for their savagery but too timid to utter a word of the mildest criticism when the Israeli army commits crimes against humanity – or watches its allies do it in Lebanon – ordinary people have to remind the world that they are not as timid as the politicians. But when the scorecard of death in Syria reaches 15,000 or 19,000 – perhaps 14 times as many fatalities as in Israel's savage 2008-2009 onslaught on Gaza – scarcely a single protester, save for Syrian expatriates abroad, walks the streets to condemn these crimes against humanity. Israel's crimes have not been on this scale since 1948. Rightly or wrongly, the message that goes out is simple: we demand justice and the right to life for Arabs if they are butchered by the West and its Israeli allies; but not when they are being butchered by their fellow Arabs.

And all the while, we forget the "big" truth. That this is an attempt to crush the Syrian dictatorship not because of our love for Syrians or our hatred of our former friend Bashar al-Assad, or because of our outrage at Russia, whose place in the pantheon of hypocrites is clear when we watch its reaction to all the little Stalingrads across Syria. No, this is all about Iran and our desire to crush the Islamic Republic and its infernal nuclear plans – if they exist – and has nothing to do with human rights or the right to life or the death of Syrian babies. Quelle horreur!

(Fonte: The Independent)

domingo, 5 de agosto de 2012

Dia D

Book Review

Uso este espaço de opinião, entre outras coisas, para a crítica de livros de história. O último livro que li foi "O Dia Mais Longo" escrito por Cornelius Ryan, sobre o dia 6 de Junho de 1944, quando os aliados invadiram a Normandia e viraram definitivamente a guerra contra as forças do Eixo e abriram a tão esperada frente ocidental. Resolvi no entanto não me limitar a analisar este livro do final dos anos 50 isoladamente, mas em comparação a outro, cujo tema é semelhante, intitulado "Operação Overlord - O Dia D e a Batalha da Normandia 1944" da autoria do historiador inglês Max Hastings e escrito já na década de 80.

Ambos são livros muito interessantes e completos. Têm algumas diferenças de âmbito e estilo significativas: Ryan concentra-se no dia 6, e conta a história do ponto de vista das suas testemunhas. Entrevistou milhares de sobreviventes de todos os lados do conflito e mostra-nos o dia do ponto de vista de cada um. O estilo é por isso extremamente pessoal e provocando mudanças de ângulo extremas conforme as personagens que o contam. Hastings pelo contrário faz um trabalho mais frio, mais baseado em documentação e menos nos testemunhos. Também beneficia naturalmente de um maior distanciamento e de todos os trabalhos que o precederam, nomeadamente o próprio "O Dia Mais Longo" que aparece na sua bibliografia. O âmbito incluí não só o famoso Dia D, mas também toda a longa preparação e a batalha completa da Normandia que durou largas semanas.

Clara nos dois livros, é a incompetência militar do alto comando alemão. O regime Nazi tinha nas suas mãos os mais veteranos, bem treinado e competentes líderes operacionais no terreno. Mas entre a loucura de Hitler, a sua convicção de que a Normandia era um engodo e o verdadeiro desembarque seria em Pas-de-Calais, a incapacidade dos que o rodeavam de o aconselharem e o medo terrível dos oficiais superiores de tomarem decisões bloquearam todo o contra-ataque nas horas cruciais. Grande parte dos oficiais responsáveis pela Normandia - a começar pelo seu general Erwin Rommel - estavam em viagens. A Luftwaffe tinha apenas dois (!!!) aviões disponíveis na zona em vez das centenas previstas, devido às suas constantes reorganizações de que era alvo (o livro "The Luftwaffe" de E. R. Hooton revela isso de uma forma inacreditável, com os seus gruppen a serem atirados de um campo de batalha para o outro ao sabor dos medos e caprichos de Berlim). Duas divisões blindadas Panzer ficaram em estado de alerta durante toda a noite (literalmente com os tanques com o motor ligado au ralenti) mas não puderam ser utilizados porque não respondiam ao comando regional mas ao Oberkommando der Wehrmacht, ou seja, ao próprio Hitler - via Marechal Wilhelm Keitel - que ninguem teve coragem de acordar.

Também impressionante, e perfeitamente alinhada nos dois livros, é a capacidade operacional militar dos exércitos ingleses que acumulavam experiência e cujo país tinha uma tradição militar entre as suas elites, que não pode ser encontrada nos EUA, que entre guerras se tornara profundamente isolacionista e onde a carreira militar não encontrava eco junto dos mais ricos, mais educados e mais poderosos. Para compensar, a capacidade logística das forças armadas americanas não tinha igual em nenhuma outra. Conseguiam fabricar mais e mais rápido, colocar tudo no terreno e fazê-lo sem grandes dificuldades mesmo quando se tratava da maior armada alguma vez vista, com 3 milhões de homens, 11 mil aviões e 4 mil navios.

No entanto, embora sejam dois livros que aconselhe sem hesitação, não pude deixar de pensar que "O Dia Mais Longo" é um reflexo claro do seu tempo, ao contrário da obra de Hastings que me parece um pouco mais intemporal. Ryan parece excessivamente correcto e limitado pelas questões geoestratégicas de uns anos 50 em que uma débil Alemanha se tinha tornado a linha da frente para uma possível guerra contra o bloco soviético. Esses mesmo alemães que ele entrevistou e descreveu no livro era na sua grande maioria agora aliados das potências ocidentais e parece existir por isso uma vontade não querer humilhá-los. Não é estranho que numa obra completa sobre uma batalha fulcral entre os aliados e o eixo a palavra Nazi seja virtualmente inexistente? Não encontramos esse género de limitações em "Operação Overlord", em que aparecem descritos os diferentes comportamentos das tropas mais fanáticas hitlerianas em relação às tropas veteranas ou de países aliados da Alemanha. Também os crimes cometidos nesse dia - nomeadamente o assassinato de prisioneiros de guerra - são praticamente ignorados em "O Dia Mais Longo" com uma breve excepção (quando uma das testemunhas encontra um pequeno grupo de prisioneiros degolados atrás de uma duna de uma das praias do desembarque).

Em ambos, o Dia D é apresentado como o momento mais importante da Segunda Guerra Mundial. Talvez seja, mas isso não será claro. Midway ou Estalinegrado certamente poderiam disputar essa honra. Mas ambos os livros foram escritos durante a guerra fria. Quando a URSS já não era aliada, mas sim um perigo muito maior do que a Alemanha Nazi e o Japão Imperial alguma vez foram. 

Em qualquer caso são dois livros que nos relembram como de vez em quando, em alguns momentos da história, um pequeno conjunto de homens carregam nos seus ombros o peso de toda a humanidade. Não são heróis porque são melhores do que todos os outros, porque tenham alguma capacidade especial ou uma preparação extraordinária. Simplesmente foram atirados para uma situação única onde não tinham outra opção senão serem heróis e morrerem, ou simplesmente morrerem.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

E porque não em Las Vegas?

Thomas Friedman - New York Times
Thomas Friedman é um escritor e jornalista do New York Times, vencedor de três prémios Pulitzer[1] e reconhecido judeu americano pró-israelita. Durante anos foi uma das vozes que esteve ao lado do massivo apoio financeiro, diplomático e militar a todos os governos israelitas, mas nos últimos anos começou a tornar-se cada vez mais crítico do governo Netanyahu e da interferência contínua dos lóbis israelitas na política americana (em especial o AIPAC).

Com a aproximação das eleições presidenciais americanas, iniciou-se também o humilhante processo que cada candidato tem que fazer para conseguir o apoio do lóbi judeu. Juras de amor eterno, visitas a Israel, promessas de, não só, não interferirem no processo de colonização da Cisjordânia, mas até de o apoiarem (mesmo sendo totalmente ilegal aos olhos das Nações Unidas), e ajudando a bloquear definitivamente o processo de paz. Desta vez é Romney que visita Netanyahu na companhia dos financeiros judeu-americanos (Sheldon Adelson entre outros), mas em breve teremos Obama também a beijar a mão aos padrinhos, um a um. E Friedman pergunta: se isto é mesmo tudo só por dinheiro, porque não reunirem-se em Las Vegas?

(Fonte: New York Time)

Why Not in Vegas?

I’ll make this quick. I have one question and one observation about Mitt Romney’s visit to Israel. The question is this: Since the whole trip was not about learning anything but about how to satisfy the political whims of the right-wing, super pro-Bibi Netanyahu, American Jewish casino magnate Sheldon Adelson, why didn’t they just do the whole thing in Las Vegas? I mean, it was all about money anyway — how much Romney would abase himself by saying whatever the Israeli right wanted to hear and how big a jackpot of donations Adelson would shower on the Romney campaign in return. Really, Vegas would have been so much more appropriate than Jerusalem. They could have constructed a plastic Wailing Wall and saved so much on gas.

The observation is this: Much of what is wrong with the U.S.-Israel relationship today can be found in that Romney trip. In recent years, the Republican Party has decided to make Israel a wedge issue. In order to garner more Jewish (and evangelical) votes and money, the G.O.P. decided to “out-pro-Israel” the Democrats by being even more unquestioning of Israel. This arms race has pulled the Democratic Party to the right on the Middle East and has basically forced the Obama team to shut down the peace process and drop any demands that Israel freeze settlements. This, in turn, has created a culture in Washington where State Department officials, not to mention politicians, are reluctant to even state publicly what is U.S. policy — that settlements are “an obstacle to peace” — for fear of being denounced as anti-Israel. 
      
Add on top of that, the increasing role of money in U.S. politics and the importance of single donors who can write megachecks to “super PACs” — and the fact that the main Israel lobby, Aipac, has made itself the feared arbiter of which lawmakers are “pro” and which are “anti-Israel” and, therefore, who should get donations and who should not — and you have a situation in which there are almost no brakes, no red lights, around Israel coming from America anymore. No wonder settlers now boast on op-ed pages that the game is over, they’ve won, the West Bank will remain with Israel forever — and they don’t care what absorbing all of its Palestinians will mean for Israel’s future as a Jewish democracy. 
      
It is into this environment that Romney wandered to add more pandering and to declare how he will be so much nicer to Israel than big, bad Obama. This is a canard. On what matters to Israel’s survival — advanced weaponry and intelligence — Defense Minister Ehud Barak told CNN on Monday, “I should tell you honestly that this administration under President Obama is doing in regard to our security more than anything that I can remember in the past.” 
      
While Romney had time for a $50,000-a-plate breakfast with American Jewish donors in Jerusalem, with Adelson at his elbow, he did not have two hours to go to Ramallah, the seat of the Palestinian Authority, to meet with its president, Mahmoud Abbas, or to share publicly any ideas on how he would advance the peace process. He did have time, though, to point out to his Jewish hosts that Israelis are clearly more culturally entrepreneurial than Palestinians. Israel today is an amazing beehive of innovation — thanks, in part, to an influx of Russian brainpower, massive U.S. aid and smart policies. It’s something Jews should be proud of. But had Romney gone to Ramallah he would have seen a Palestinian beehive of entrepreneurship, too, albeit small, but not bad for a people living under occupation. Palestinian business talent also built the Persian Gulf states. In short, Romney didn’t know what he was talking about.
On peace, the Palestinians’ diplomacy has been a fractured mess, and I still don’t know if they can be a partner for a secure two-state deal with even the most liberal Israeli government. But I do know this: It is in Israel’s overwhelming interest to test, test and have the U.S. keep testing creative ideas for a two-state solution. That is what a real U.S. friend would promise to do. Otherwise, Israel could be doomed to become a kind of apartheid South Africa. 
      
And here is what I also know: The three U.S. statesmen who have done the most to make Israel more secure and accepted in the region all told blunt truths to every Israeli or Arab leader: Jimmy Carter, who helped forge a lasting peace between Israel and Egypt; Henry Kissinger, who built the post-1973 war disengagement agreements with Syria, Israel and Egypt; and James Baker, who engineered the Madrid peace conference. All of them knew that to make progress in this region you have to get in the face of both sides. They both need the excuse at times that “the Americans made me do it,” because their own politics are too knotted to move on their own. 
      
So how about all you U.S. politicians — Republicans and Democrats — stop feeding off this conflict for political gain. Stop using this conflict as a backdrop for campaign photo-ops and fund-raisers. Stop making things even worse by telling the most hard-line Israelis everything that they want to hear, just to grovel for Jewish votes and money, while blatantly ignoring the other side. There are real lives at stake out there. If you’re not going to do something constructive, stay away. They can make enough trouble for themselves on their own.

A rota suicida do futebol


Sou um amante do futebol. Não sou um especialista no assunto, não leio os jornais desportivos diariamente, não quero que o meu clube ganhe a qualquer preço, mas sofro durante umas horas por semana e tenho os ataques de alegria e tristeza próprios de quem é apaixonado por este desporto.

É por isso que vejo com grande tristeza os clubes portugues (e não só...) a manterem um caminho que os levará inevitavelmente à ruína. Os líderes dos pequenos e grandes clubes portugueses comportam-se como se as receitas televisivas fossem aumentar para sempre, quando na realidade já cairam; como se a os juros fossem ficar baixos para sempre, quando os spreads já são altíssimos; como se os compradores estrangeiros dos passes dos jogadores fossem continuar a pagar mais e mais, quando na realidade já só uns poucos clubes detidos por sheikhs árabes mantêm esse tipo de saúde financeira.

Serei só eu que acho que os clubes portugueses têm que começar a vender enquanto os jogadores ainda têm valor? A crise que atravessa a europa, e Portugal em particular, vai inevitavelmente chegar ao futebol. Os bancos têm menos dinheiro para emprestar e o que emprestam é mais caro. Os adeptos estão mais cautelosos por terem visto os seus rendimentos decrescerem e as nuvens negras persistirem no horizonte. E o mercado das receitas televisivas caiu desenfreadamente pois as empresas estão a apertar o cinto, nomeadamente nos custos não-operacionais como é a publicidade.

Mesmo que isso custe desportivamente, os clubes portugueses - grandes e pequenos - têm urgentemente que colocar um travão no caminho da dívida descontrolada. Não é a primeira vez que o fazem, mas em melhores períodos o povo português apoiou (ou forçou) o Estado a intervir com perdões duvidosos aos clubes. Neste momento, tenho sérias dúvidas de que o povo exigisse isso. Pelo contrário. Eu - e acredito que milhões de outros portugueses pensarão da mesma forma - preferia ver o meu clube a afundar-se até aos distritais a ver o estado a derreter mais umas largas centenas de mihões de euros para garantir que continuamos a ter aqui alguns dos melhores clubes e jogadores do mundo.

Neste momento, muitos dos jogadores dos clubes nacionais ainda têm bastante valor de mercado. Mas bastam algumas notícias declarando a iminente falência de um deles para os seus jogadores entrarem em saldo. E alguém têm dúvidas de que isso pode acontecer? Reduzam o ritmo e valor das compras, mantenham as vendas e apostem na formação de jogadores. Já!

Onde estão hoje o Campomaiorense, o Boavista, o Salgueiros e o Estrela da Amadora? Infelizmente não ficarei surpreendido quando um dos três grandes se juntar a esta lista.