
Ambos são livros muito interessantes e completos. Têm algumas diferenças de âmbito e estilo significativas: Ryan concentra-se no dia 6, e conta a história do ponto de vista das suas testemunhas. Entrevistou milhares de sobreviventes de todos os lados do conflito e mostra-nos o dia do ponto de vista de cada um. O estilo é por isso extremamente pessoal e provocando mudanças de ângulo extremas conforme as personagens que o contam. Hastings pelo contrário faz um trabalho mais frio, mais baseado em documentação e menos nos testemunhos. Também beneficia naturalmente de um maior distanciamento e de todos os trabalhos que o precederam, nomeadamente o próprio "O Dia Mais Longo" que aparece na sua bibliografia. O âmbito incluí não só o famoso Dia D, mas também toda a longa preparação e a batalha completa da Normandia que durou largas semanas.

Também impressionante, e perfeitamente alinhada nos dois livros, é a capacidade operacional militar dos exércitos ingleses que acumulavam experiência e cujo país tinha uma tradição militar entre as suas elites, que não pode ser encontrada nos EUA, que entre guerras se tornara profundamente isolacionista e onde a carreira militar não encontrava eco junto dos mais ricos, mais educados e mais poderosos. Para compensar, a capacidade logística das forças armadas americanas não tinha igual em nenhuma outra. Conseguiam fabricar mais e mais rápido, colocar tudo no terreno e fazê-lo sem grandes dificuldades mesmo quando se tratava da maior armada alguma vez vista, com 3 milhões de homens, 11 mil aviões e 4 mil navios.
No entanto, embora sejam dois livros que aconselhe sem hesitação, não pude deixar de pensar que "O Dia Mais Longo" é um reflexo claro do seu tempo, ao contrário da obra de Hastings que me parece um pouco mais intemporal. Ryan parece excessivamente correcto e limitado pelas questões geoestratégicas de uns anos 50 em que uma débil Alemanha se tinha tornado a linha da frente para uma possível guerra contra o bloco soviético. Esses mesmo alemães que ele entrevistou e descreveu no livro era na sua grande maioria agora aliados das potências ocidentais e parece existir por isso uma vontade não querer humilhá-los. Não é estranho que numa obra completa sobre uma batalha fulcral entre os aliados e o eixo a palavra Nazi seja virtualmente inexistente? Não encontramos esse género de limitações em "Operação Overlord", em que aparecem descritos os diferentes comportamentos das tropas mais fanáticas hitlerianas em relação às tropas veteranas ou de países aliados da Alemanha. Também os crimes cometidos nesse dia - nomeadamente o assassinato de prisioneiros de guerra - são praticamente ignorados em "O Dia Mais Longo" com uma breve excepção (quando uma das testemunhas encontra um pequeno grupo de prisioneiros degolados atrás de uma duna de uma das praias do desembarque).
Em ambos, o Dia D é apresentado como o momento mais importante da Segunda Guerra Mundial. Talvez seja, mas isso não será claro. Midway ou Estalinegrado certamente poderiam disputar essa honra. Mas ambos os livros foram escritos durante a guerra fria. Quando a URSS já não era aliada, mas sim um perigo muito maior do que a Alemanha Nazi e o Japão Imperial alguma vez foram.
Em qualquer caso são dois livros que nos relembram como de vez em quando, em alguns momentos da história, um pequeno conjunto de homens carregam nos seus ombros o peso de toda a humanidade. Não são heróis porque são melhores do que todos os outros, porque tenham alguma capacidade especial ou uma preparação extraordinária. Simplesmente foram atirados para uma situação única onde não tinham outra opção senão serem heróis e morrerem, ou simplesmente morrerem.
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