segunda-feira, 23 de abril de 2012

Vaga de Emigração

Desde criança que me lembro de ouvir falar das Remessas de Emigrantes. Nos anos 80, esta era uma das principais componentes da economia portuguesa e chegou a representar quase 10% do PIB. Numa altura em que centenas de milhares de portugueses se lançam para o estrangeiro à procura de oportunidades para trabalhar ou de melhorar os seus salários e oportunidades de carreira, as remessas de emigrantes e o conhecimento adquirido destes profissionais poderão voltar a ser um trunfo para Portugal. Mas para que isto aconteça, os nossos governantes terão que agir em conformidade e não permitirem que esta oportunidade seja perdida.

Muita coisa mudou desde os anos 80, o país deu um salto de gigante na modernização das suas infraestruturas rodoviárias, transportes públicos, ensino, judiciais, etc., a integração europeia permitiu um enorme investimento em muitas áreas críticas, a população nacional aumentou muito o seu nível de escolaridade e várias áreas económicas foram abandonadas e outras descobertas. Para além disso, beneficiamos também de muitos desenvolvimentos tecnológicos das últimas três décadas que permitiram uma mudança radical no estilo de vida e na forma de trabalhar tais como a internet ou o telemóvel. Muitas das ferramentas ao dispor dos governos desapareceram, tais como o controlo fronteiriço e os impostos alfandegários (dentro da UE) ou controlo cambial.

Não obstante todos esses progressos (e em alguns casos retrocessos), Portugal encontra-se novamente numa situação de emergência financeira, económica e social. A situação em que o estado português se encontrava em 2011 e subsequente pedido de resgate colocou o país novamente na mira de especuladores, reduziu brutualmente o investimento e apoios dados pelo estado e por efeito quer psicológico quer real levou os portugueses a consumirem muito menos, adiando todas as compras e investimentos grandes e tornando-se super sensíveis ao preço dos consumos e investimentos aos quais não podem fugir. Para além disso, o nível de impostos necessários para cobrir o buraco das finanças públicas continua a subir atingindo recordes históricos e o número também inédito de desempregados faz com que o número de pessoas dependentes do estado aumente enquanto os que são contribuintes líquidos diminua.

Neste contexto, o número de emigrantes disparou enquanto muitos dos imigrantes regressaram aos seus países de origem ou arriscaram em novas paragens. Quanto mais tempo durar a crise, maiores são as probabilidades de estas pessoas irem cortando os seus laços a Portugal e de não voltarem mais. Para termos noção dos números, e segundo o secretário de estado das comunidades portuguesas, José Cesário, mais de 100 mil portugueses emigraram em 2011 (cerca de 1% da população), para além de milhares de estrangeiros que regressaram aos países de origem (em especial angolanos e brasileiros cujos países crescem neste momento muito acima dos países europeus) e de uma espectável quebra no regresso de emigrantes. A mesma fonte adiantou ao ionline.pt que este vaga começou há cerca de 5 anos e os dados do governo brasileiro mostram que os pedidos de residência permanente por parte de portugueses entre Junho 2010 e Dezembro de 2011 ultrapassaram os 325 mil. Não deverá por isso haver dúvidas da quantidade de pessoas que estão a mudar a sua vida para o estrangeiro.

Naturalmente, o governo português em nada se opõe a este movimento migratório. Aliás, em várias ocasiões, o primeiro ministro e outros membros do governo apoiaram-na publicamente aconselhando os jovens a aproveitar as oportunidades que existem fora do país para ganhar dinheiro e experiência, e construir carreiras que neste momento lhes estão inevitavelmente negadas em Portugal. Não pretendo aqui entrar nas polémicas que foram geradas à volta dessas declarações, limitando-me a dizer que não é diferente do que os meus pais me disseram e do que muitos outros dizem aos seus filhos à medida que vêm as portas fecharem-se uma após a outra dentro do território nacional.

A minha questão é: o que pretendemos fazer em relação a isto para fazer com que estas pessoas não deixem de ser portuguesas ao fim de uns anos ou décadas?

O país fez investimentos colossais no sector da educação durante as últimas décadas. Em 2010 este valor atingiu os 8559 milhões de Euros, só ultrapassado pela Saúde e Segurança Social. Agora outros países vão beneficar destes recursos, uma geração mais qualificada do que qualquer outra que a tenha precedido em Portugal.

Mas as crises não duram para sempre. Nem mesmo esta que ainda nos causará muitas dores antes de ser finalmente esquecida. E o país deve-se preparar para poder receber novamente estes emigrantes e as suas famílias, com os seus conhecimentos adquiridos, capacidade de investimento e know-how do que se faz noutras paragens. Também os conhecimentos pessoais adquiridos noutras paragens (vulgo networking) poderá ser um factor importante para ajudar o crescente sector exportador português a conquistar novos mercados que até aqui nem sabíamos que existiam ou que nos pareciam incrivelmente distantes.

No entanto os emigrantes não voltaram todos a correr ao primeiro sinal de crescimento. Cada um tomará a sua decisão independentemente dos demais e certamente terá como principais factores o emprego e os laços familiares. Os que se casam e têm filhos no estrangeiro terão bons motivos para não regressarem. Mas também são muitos os que tiveram que emigrar deixando para trás a sua família e provavelmente regressarão a Portugal muito mais cedo. Em qualquer caso, estamos a falar de muitas pessoas, muitos conhecimentos e muito dinheiro.

O que eu espero deste e dos próximos governos no que se relaciona a esta temática é que crie todas as condições para que as pessoas voltem, invistam o seu dinheiro, comprem casa nas suas aldeias, que tenham as suas poupanças protegidas, que se esforcem para garantir que os filhos destes não perdem o acesso à língua de Camões, que conseguem visitar Portugal com regularidade. Muitas destas acções não involvem sequer dinheiro significativo, tais como a facilidade de dar vistos de residência e turismo aos familiares dos portugueses residentes no estrangeiro e casados com pessoas de outras nacionalidades. Que as remessas de emigrantes sejam protegidas de taxação excessiva, que a diplomacia portuguesa redobre os seus esforços juntamente com a CPLP de forma a que o ensino da nossa língua no estrangeiro seja facilitado ao máximo.

Não somos o primeiro país passar por uma vaga de emigração. Não é sequer a primeira vez que isto acontece a Portugal. Compreender o fenómeno e perceber como podemos tirar partido dele quando chegar o momento certo pode ser mais um contributo para podermos ver Portugal novamente de cabeça erguida.

11 comentários:

  1. ha dois problemas gravissimos em portugal que faz com que a nossa emigração tenham as caracteristicas que tem:
    1- a forma como os portugueses vêm a europa vs a forma como o resto da europa se ve entre eles.
    ha uma mentalidade de periferia nas empresas e nas pessoas que não corresponde à limitação geográfica verdadeiramente dita
    hoje é possivel trabalhares em paris ou berlim sem abandonares portugal. a europa esta separada por +/- 3horas de viagem num avião contudo isso não está devidamente assimilado pelas pessoas.

    nos paises do bloco central esta abertura esta presente em todas as empresas, mesmo pequenas empresas têm como mercado alvo 3-4 paises desde o 1º dia
    em portugal a mentalidade empresarial nem para espanha olha como terreno natural de implantação...espanha por regra é vista como expansão
    isto é um erro estratégico sistemático.

    2- o pior dos problemas, falta de competitividade fiscal, estamos dramáticamente "tramados", dou só um exemplo de um pais comparável a républica checa (o pais tem muitas similaridades com portugal, a todos os niveis) os impostos sobre rendimentos são flat 15%. vs a estupidez portuguesa que chega a 42%
    claro que assim quem procura outros mercados a titulo individual ao faze-lo, mete os "papeis do divorcio" a titulo definitivo com portugal.

    cumps

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    1. boas boas

      Em relação ao primeiro problema que colocas, concordo que existiu e em parte ainda existe, mas que está a mudar. E esta vaga de emigração e exportação mostra que quer os portuguesas quer as suas empresas estão dispostas a mais do que no passado (por motivos óbvios). Em relação a Espanha, não me parece o melhor mercado, mas claro que isso depende muito do que estamos a vender. Acho as apostas em África, Médio Oriente e Europa central e de leste mais acertadas, falando genericamente.

      Sobre a competitividade fiscal, é sem dúvida um problema gravíssimo - embora provavelmente inevitável a curto prazo - só espero que que assim que comece e existir margem, daqui a uns anos, a opção dos governos da altura não seja o de andarem a gastar ainda mais.

      Cmps,

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    2. boas

      pego logo na tua frase "Em relação a Espanha, não me parece o melhor mercado" espanha devia ser sempre considerado como mercado doméstico em termos estratégicos, lingua não é grande barreira nem o alinhamento cultural, nem a geografia, é mais barato ires a madrid na easy jet do que ires ao porto!!! de comboio!!!.

      por isso espanha deveria estar numa estratégia de mercado doméstico e não de exportação. sim está mal e não é grande mercado dada a situação actual... está igual a portugal é esse o meu ponto estamos sempre de mão dada em regra, se tiras a linha que a história desenhou nos mapas, tens o teu verdadeiro mercado doméstico.

      só um exemplo, como sabes trabalhei muito na alemanha e para eles alemanha e austria é sempre estratégicamente um mercado doméstico, parece que a 2ª guerra n passou por lá a deixar mais uma linha no mapa (por vezes agem da mesma maneira ao adicinarem o benelux), esta filosofia de não olhar para fronteiras de mapas mas para fronteiras "reais" de mercado, trás grandes resultados.

      por vezes no IT ha grandes "asneiradas" porque não se consegue separar o que é de um pais ou do outro, aquilo é "tudo igual",

      mas por exemplo para eles frança é uma barreira e sentes isso ... n sei se me consigo fazer entender.

      repara tens um pingo doce em vila real de santo antónio (18K habitantes), mas a 8 ou 9 km tens ayamonte vila com o mesmo tamanho não tens um pingo doce. pq é em espanha.
      e é uma vila que em termos de logistica, centos de distribuição etc, não daria mais custos por estar tão proximo. mesma coisa para vigo e por ai fora era até uma forma de combateres a desertificação do interior, esta criação de valências com espanha a começar pelas regiões fronteiriças, em vez de espanha servir só para "comprar caramelos e encher o depósito de gasolina"

      quando falas em mercados transcontinentais com africa ou medio oriente ai sim faz sentido outra abordagem, pq a geografia é um obstaculo real, agora haver uma barreira tão grande só porque se atravessou um rio....

      cumps

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    3. Boas boas

      Sim, Espanha é mercado doméstico. Mas tal como em relação a Portugal não vejo que tenha um futuro próximo muito brilhante.

      O exemplo que deste de um Pingo Doce por exemplo é óptimo porque aproveita tudo o que já existe em termos logísticos. Por outro lado, Espanha é um país bastante parecido com Portugal em termos de oferta e procura (embora com maior escala). Regra geral, aquilo em que somos bons eles também são. Existem excepções e devemos aproveitar esses desequilíbrios mas não prevejo que seja possível imaginar crescimentos das exportações para Espanha a dois dígitos nos próximos anos.

      Mas se queremos pensar em termos mais gerais provavelmente as verdadeiras margens encontram-se em lugares com altos níveis de crescimento, onde a concorrência (ainda) é limitada.

      Os países de língua portuguesa têm ainda a vantagem de termos uma vantagem de adaptação muito maior do que os nossos concorrentes directos.

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  2. 'Esforçem' e 'língua de Camões' na mesma frase não fica bem. Muda lá isso, até não escreves mal, mas isso é um atentado à expressão lusófona.

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    1. Caro Cordeiro

      Os meus sinceros agradecimentos pela correcção. Está à vontade para corrigires qualquer coisa que não esteja bem. Infelizmente tenho o péssimo hábito de não rever o que escrevo por isso depois acabo a levar nas orelhas. :)

      Cmps,

      António

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  3. Boas
    A culpa desta crise se instalar em portugal e logicamente a pessima gestao dos nossos politicos ao longo destes anos, logico que um pais que se quer modernizar gasta dinheiro, mas com essa modernizaçao tem que ter retorno, que retorno obteve portugal???
    Depois em portugal nunca houve fiscalizaçao apertada em quase nada para nao dizer em nada, eu estou na suiça e ve se uma cultura financiaria bem diferente da de portugal, mas nao e preciso ter a suiça como exemplo, basta olhar para a holanda um pais pequeno como portugal que esta na uniao europeia mas tem uma economia global, portugal tem o que??? so se preocuparam agora com isso porque tem o cu apertado desculpem me a expressao.
    Depois o português pensa que a Europa e o el dorado do planeta terra, a europa meus caros ja deu o que tinha a dar, eu estou na suiça e vim estudar para ca com 12 anos se nao o tivesse feito estava com a vida complicada porque estaria desempregado, mesmo que viesse para a suiça lavar pratos dificilmente arranjaria trabalho, isso porque??? porque a suiça começa a ser mais exigente no que diz respeito ao contole da imigraçao. Isto nao e a suiça dos anos 90 em que um portuga chegava ca passado 4 ou 5 dias ja estava trabalhar os patroes agora nao dao os permissos os trabalhadores como a 20 anos atras, esta e a dura realidade de um continente que aos poucos se esta a afundar.
    Se os nosso politicos deixassem de ser corruptos e mal feitores, e motivassem os portugueses espalhados pelo mundo a regressarem a portugal incentivando a investir o seu dinheiro......
    Mas pronto fazer o que nao houve um 1º ministro que dizia se os arabes tem o petrolio nos temos os imigrantes, pois bem hoje em dia nem dinheiro enviam para portugal muitos deles.
    Cumps.

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    1. Caro Anónimo

      A questão do investimento e retorno que refere é para mim crucial. Vimos o nosso governo (o anterior) a aumentar o seu passivo em 100.000.000.000 EUR e olhamos à nossa volta e não percebemos onde é que o gastaram. O que quer que seja não parece ter um retorno por aí além.

      Numa situação semelhante esteve o Dubai, há uns dois anos atrás. Vivi lá muitos anos e ainda recentemente lá fui. O buraco deles era de 50.000.000.000 USD, mas bem ou mal eu consigo ver onde o gastaram: Palm Jumeirah, Marina, Burj Khalifa (ou Burj Dubai no nome original), etc. Tudo coisas que poderão ter ou não sucesso mas que têm objectivos claros de transformar o Dubai na capital empresarial do Médio Oriente e a maior cidade turística da região.

      Podem falhar, mas pelo menos tentaram. A impressão que tenho é que Portugal nem tentou.

      Sobre a vida e as oportunidades na Suíça prefiro não me alongar muito pois não conheço essa realidade. Mas o que me conta é interessante e importante.

      Por fim, eu percebo que Portugal não crie oportunidades para os nossos jovens (e não só) ficarem e a emigração é um passo natural e lógico. Mas está nas mãos dos políticos garantirem que estes não vão para nunca mais voltarem. As remessas de emigrantes poderão vir a ser valiosas para o país, mas os emigrantes só enviarão o seu dinheiro se isso lhes compensar. E o regresso destes para investir no país só acontecerá se tiverem vantagens claras nisso. De outra forma, depois de terem feito o mais difícil que é sair de casa, poucos motivos terão para voltarem.

      Cmps,

      António

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    2. Caro António

      Eu nao conheço a realidade do Dubai nem nunca la estive, mas nao se pode comparar os EAU a portugal basta comparar seu PIB ao portugues, e os EAU sao um economia subdesenvolvimento o mesmo ja nao podemos dizer de Portugal, depois o EAU tem as exportações de petróleo e gás natural desempenham um papel importante na economia, especialmente em Abu Dhabi e infelizmente Portugal nao tem nenhum recursos fóssil que possa ajudar a economia a regerar se. Eu so vou a Portugal uma vez por ano normalmente em Dezembro, e nao estou a par da realidade portuguesa, maa a ultima vez quando foi as coisas nao estavam muito boas na minha regiao (DOURO) e agora suponho que estejam bem piores.
      Eu vi mais ou menos nos meados de Fevereiro/Março um programa em um canal italiano chamado ''presa direta'' em que mostra a realidade dos desempregados portugueses na capital, onde mostra a zona industrial da area metropolitana de Lisboa que dava trabalho cerca de 18000 pessoas e agora mal chegam a 2000. Realmente e com alguma tristeza que vejo assim o nosso pais, falta coragem e dignidade aos nossos políticos porque o que esta a acontecer ao povo não e justo, a classe media (falsa classe media) a cada vez mais pessoas a imigrar e o pais mais envelhecido e isolado.

      PS: este e o link do tal programa http://www.youtube.com/watch?v=boYEdRzTjpE

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    3. Caro Anónimo

      Recebi no email que tinha uma resposta sua aqui no blog mas por algum motivo não se encontra aqui publicada, não tenho a certeza porquê.

      Cmps,

      António

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    4. Estava na caixa de spam, já aparece.

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