Desde que me lembro que ouço a mesma conversa de que a educação é remédio para todos os males do país e dos seus cidadãos. Não tenho dúvidas de a educação é importantíssima e que as nossas vidas seriam muito diferentes - para pior - se todos dependessemos exclusivamente da lições aprendidas na "universidade da vida". No entanto, se isto pode ser uma verdade a um nível estratégico não significa que os seus detalhes sejam indiferentes.
A minha apreensão começou com uma famosa gaffe do então Primeiro Ministro António Guterres, sobre a sua conhecida "paixão pela educação". Depois de afirmar que os gastos com a educação deveriam subir até atingir até aos 5% do PIB, um dos jornalistas presentes pergunta-lhe qual é o valor disso. Guterres começa a gaguejar qualquer coisa como "O PIB são 3.000 milhões de contos... cinco vezes três... quinze... é uma questão de saber fazer as contas".
Os media fizeram a festa durante semanas pelo facto de o primeiro ministro não ter sido capaz de fazer a conta de cabeça, mas não pareceram notar o facto de existirem dois erros bem mais graves na declaração.
Em primeiro lugar, que o PIB naquela altura era de 15.000 milhões de contos, e é muito grave que um primeiro ministro não tenha noção sequer da ordem de grandeza do PIB. Não conseguiu sequer acertar no número de dígitos. Mas adiante...
O segundo erro, mais profundo, é esta vontade de gastar dinheiro, de resolver os problemas inundando-os de contos (ou euros hoje em dia). A própria frase demonstra que o objectivo é o de atingir um determinado nível de gastos, medido pelo dinheiro investido, e não o de conseguir objectivos ao nível de licenciados, de cobrir falhas específicas, de corrigir desequilíbrios entre oferta e procura de recursos humanos ou de aposta numa ou outra área que o país pretende apostar no futuro.
Não obstante o enorme incremento do número de licenciados, conhecemos todos demasiados casos de gente que (1) acabou os seus estudos e emigrou, (2) que estudaram para acabarem empregados em áreas diferentes (muitas vezes profissões "piores" aos olhos dos próprios) ou (3) que continuam a fazer mestrados, doutoramentos e outras especializações por falta de lugar no mercado de trabalho.
São três situações que parecem cada vez mais comuns e onde o país (em conjunto com as famílias) não consegue capitalizar o esforço que fez na educação das pessoas. Para que fique claro, não ponho de forma alguma em causa a opção destas pessoas que legitimamente estão a tentar tomar conta de si e dos seus. E quando o fazem, seja emigrando, aceitando empregos em áreas diferentes ou aproveitando as oportunidades de continuar a estudar, estão a tomar decisões legítimas e lógicas. Mas o investimento do país está feito. E tentar, como o nosso antigo Primeiro Ministro, simplificar a "paixão pela Educação" a um número em euros. Ou continuaremos a cometer o erro de gastar milhares de milhões que são depois desaproveitados ou aproveitados apenas por outros países.
Há quantas décadas sabemos que o número de advogados, biólogos e professores de inúmeras áreas são muito mais do que as necessidades do país? Por que motivo continuamos a promover que mais e mais estudantes sigam esses caminhos? Há quantas décadas sabemos que faltam médicos, informáticos e técnicos especializados? Por que motivo continuamos a impedir a criação de universidades e escolas para algumas dessas áreas e ceder a chantagens de grupos de pressão?
Eu não tenho dúvidas de que a Educação é a mais poderosa de todas as formas de tirar uma pessoa ou um povo da pobreza. Mas isso não significa que todo e qualquer Euro lá gasto seja bem gasto.
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