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Estas são histórias contadas vezes sem conta em livros e filmes, mas que de alguma forma não cansam porque esta guerra continua a ter algo de único e absoluto. Algo que não podemos permitir que se repita.
Há uns anos atrás, num documentário sobre este tema, uma idosa alemã contava como tinha sido violada por membros do Exército Vermelho durante a invasão de Berlim, quando ainda era jovem. Mais do que a sua descrição, o que me tocou mais foi a sua frase final: "não acredito que tenha havido alguma mulher em todo o país que não tenha sido violada". Essa ideia de uma violação massiva de todo um país era algo que só poderia ser comparado com os crimes dos próprios nazis. Mas que, ao contrário destes, não era particularmente recordada. Mesmo que essa frase não pudesse ser levada à letra, mostra sem margem para dúvidas um crime em larga escala cometido por um exército e devidamente abafado pelas potências vencedoras.
Antony Beevor mostra-nos toda essa história. Da violência de um Exército Vermelho decidido a vingar as atrocidades cometidas pelos nazis nas nações soviéticas. Da facilidade com que pilhavam, destruíam e violavam tudo o que encontravam. Um exército de milhões, totalmente desorganizado, fanaticamente decidido e acossado a conquistar Berlim a tempo das comemorações do 1º de Maio em Moscovo, resultando em inúmeras mortes causadas por "fogo-amigo".
A insanidade da liderança nazi é também um dos assuntos centrais deste livro. A sua insensibilidade ao sofrimento que causaram aos seus próprios civis. A forma como obrigaram crianças e velhos a pegar em armas e como enforcaram ou fuzilaram todos aqueles que fugiram ao recrutamento ou que colocaram bandeiras brancas de rendição nas janelas de suas casas. Como, com a frente russa a centenas de metros de distância, Hitler ainda falava das suas armas maravilha, dos seus exércitos que na realidade já não existiam e de como iria dar a volta à guerra. E, talvez o mais inacreditável, como até à sua morte conseguiu manter um controlo total sobre o aparelho político e militar.
Uma última nota para a importância das topas nazis estrangeiras que lutaram até ao último dia na defesa de Berlim. É algo de que - confesso - não tinha noção que tomara tais proporções. Tropas SS escandinavas, russas e francesas lutaram fanaticamente contra os exércitos russos, mesmo quando os exércitos sobreviventes alemães lutavam apenas com o objectivo de se conseguirem entregar às potências ocidentais, dados os seus receios de serem escravizados pela URSS. Naturalmente, estes nazis estrangeiros tinham poucos motivos para acreditar que seriam bem tratados nos seus países de origem, o que pode ajudar a explicar porque não encontraram outra saída senão a luta até à morte.
Um livro muito interessante, e onde não me é possível fazer nenhuma crítica negativa. Um autor a que espero regressar em breve.