Book Review
Que livro! O Coronel David Martelo analisa a forma como as grandes potências do mundo cairam na loucura da primeira guerra mundial, então conhecida como "A Grande Guerra". É difícil descrever este livro, mas digo-vos com toda a sinceridade que fiquei várias vezes sem fôlego enquanto o lia. Como um bom filme de terror e suspense do qual sabemos que grande parte das personagens terão um fim trágico, também neste livro temos vontade de gritar aos principais actores e rogar-lhes para que corrigam o caminho. Chegamos ao final com a sensação de que o deveríamos começar a ler novamente do início, mas tendo a consciência de que o sabor já não será o mesmo.
Compreensivelmente, este militar de carreira consegue-nos explicar claramente os erros táticos e estratégicos cometidos pelas diversas forças armada com enorme facilidade, nomeadamente a formma como todos os lados tinham a certeza de que a guerra seria curta e de movimento, com a cavalaria a ter um papel fundamental. As recentes guerras dos Boeres, na África do Sul e a guerra Russo-Japonesa também foram olimpicamente ignoradas, sendo que estas já davam indicações de que o poder de fogo das metralhadores modernas, juntamente com a invenção das minas terrestres e do arame farpado, colocava os defesas em enorme vantagem sobre os atacantes. Também a distância e precisão do tiro tinham aumentado muitíssimo e as novas armas permitiam a sua utilização com os soldados deitados, o que mais uma vez fortalecia as defesas. Por fim a utilização de comunicações terrestres (telefone com fios, já que o sem fios era demasiado pesado para campanha e era usado apenas nos barcos) abriu o caminho para que a artilharia de longo alcance actuasse em conjunto com observadores próximos do alvo, ajudando-os a corrigir a posição. Enquanto tudo isto acontecia, a generalidade dos exércitos - em especial o que era considerado o melhor de todos, o françês - falavam apenas de honra e da importância do combate decisivo. Apoiando-se nas brilhantes teorias militares napoleónicas, considerava-se que as guerras se ganhavam quebrando o ânimo do adversário, tipicamente numa única batalha enorme e decisiva. Enquanto isso, os alemães preparavam uma estratégia de ataque com táticas de defesa, ou seja, segundo o plano Schlieffen, uma enorme manobra de envolvimento através da Bélgica (i.e. violando a neutralidade da Bélgica) procuraria fechar os exércitos franceses e ir directo a Paris. Em simultâneo, quando encontravam adversários preparavam imediatamente trincheiras, sendo que a pá (talvez a arma mais importante de toda a guerra...) fazia parte do kit standard dos soldados alemães.
Mas se na sua vertente militar e tecnológica, David Martelo é obviamente um especialista, devo admitir que fiquei surpreendido com a qualidade e profundidade da sua análise da política e diplomacia da época. É clara, bem documentada e lógica. Desde as ambições dos novos impérios da europa, como a Alemanha, a Itália e até a Sérvia com as suas ambições de unir os eslavos do sul (o que mais tarde se veio a chamar de Jugoslávia), até ao movimento esperado dos velhos impérios de manter a sua posição, tal como o Reino Unido, a Rússia czarista e o império Austro-Húngaro.
Um livro interessantíssimo, bem escrito e que não exige qualquer conhecimento prévio sobre o assunto.
Título: Origens da Grande Guerra
Subtítulo: Rumo às trincheiras. Percurso político-militar (1871-1914)
Autor: David Martelo
Editora: Edições Sílabo
PS (2013-04-19): A editora Sílabo teve a amabilidade de disponibilizar no seu site o primeiro capítulo do livro. Aqui fica o link.
Que livro! O Coronel David Martelo analisa a forma como as grandes potências do mundo cairam na loucura da primeira guerra mundial, então conhecida como "A Grande Guerra". É difícil descrever este livro, mas digo-vos com toda a sinceridade que fiquei várias vezes sem fôlego enquanto o lia. Como um bom filme de terror e suspense do qual sabemos que grande parte das personagens terão um fim trágico, também neste livro temos vontade de gritar aos principais actores e rogar-lhes para que corrigam o caminho. Chegamos ao final com a sensação de que o deveríamos começar a ler novamente do início, mas tendo a consciência de que o sabor já não será o mesmo.
Compreensivelmente, este militar de carreira consegue-nos explicar claramente os erros táticos e estratégicos cometidos pelas diversas forças armada com enorme facilidade, nomeadamente a formma como todos os lados tinham a certeza de que a guerra seria curta e de movimento, com a cavalaria a ter um papel fundamental. As recentes guerras dos Boeres, na África do Sul e a guerra Russo-Japonesa também foram olimpicamente ignoradas, sendo que estas já davam indicações de que o poder de fogo das metralhadores modernas, juntamente com a invenção das minas terrestres e do arame farpado, colocava os defesas em enorme vantagem sobre os atacantes. Também a distância e precisão do tiro tinham aumentado muitíssimo e as novas armas permitiam a sua utilização com os soldados deitados, o que mais uma vez fortalecia as defesas. Por fim a utilização de comunicações terrestres (telefone com fios, já que o sem fios era demasiado pesado para campanha e era usado apenas nos barcos) abriu o caminho para que a artilharia de longo alcance actuasse em conjunto com observadores próximos do alvo, ajudando-os a corrigir a posição. Enquanto tudo isto acontecia, a generalidade dos exércitos - em especial o que era considerado o melhor de todos, o françês - falavam apenas de honra e da importância do combate decisivo. Apoiando-se nas brilhantes teorias militares napoleónicas, considerava-se que as guerras se ganhavam quebrando o ânimo do adversário, tipicamente numa única batalha enorme e decisiva. Enquanto isso, os alemães preparavam uma estratégia de ataque com táticas de defesa, ou seja, segundo o plano Schlieffen, uma enorme manobra de envolvimento através da Bélgica (i.e. violando a neutralidade da Bélgica) procuraria fechar os exércitos franceses e ir directo a Paris. Em simultâneo, quando encontravam adversários preparavam imediatamente trincheiras, sendo que a pá (talvez a arma mais importante de toda a guerra...) fazia parte do kit standard dos soldados alemães.
Mas se na sua vertente militar e tecnológica, David Martelo é obviamente um especialista, devo admitir que fiquei surpreendido com a qualidade e profundidade da sua análise da política e diplomacia da época. É clara, bem documentada e lógica. Desde as ambições dos novos impérios da europa, como a Alemanha, a Itália e até a Sérvia com as suas ambições de unir os eslavos do sul (o que mais tarde se veio a chamar de Jugoslávia), até ao movimento esperado dos velhos impérios de manter a sua posição, tal como o Reino Unido, a Rússia czarista e o império Austro-Húngaro.
Um livro interessantíssimo, bem escrito e que não exige qualquer conhecimento prévio sobre o assunto.
Título: Origens da Grande Guerra
Subtítulo: Rumo às trincheiras. Percurso político-militar (1871-1914)
Autor: David Martelo
Editora: Edições Sílabo
PS (2013-04-19): A editora Sílabo teve a amabilidade de disponibilizar no seu site o primeiro capítulo do livro. Aqui fica o link.
Pois tive a satisfação de ler esta obra e posso dizer que é leitura muito fluente e que permite ao leitor sentir-se como uma personagem testemunha da evolução dos acontecimentos que levaram ao desencadear da Grande Guerra.
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