Um fenómeno estranho e que sempre achei curioso é a forma quase perfeita como conseguimos catalogar a posição que cada um tem em relação ao conflito israelo-palestiniano baseados na posição política nacional (esquerda ou direita). As convicções são tais que são imunes a factos e desenvolvimentos. Diferentes governos tomam posse quer em Israel quer na Palestina, mas o apoio que cada um recebe do resto do mundo é sempre rigorosamente na mesma direcção.
E isto leva a alianças curiosas: os comunistas por exemplo, acabam muitas vezes aliados aos fundamentalistas islâmicos, quando os primeiros são o mais longe que pode haver de políticas baseadas na palavra dos livros sagrados. A União Soviética, o exponente máximo desse fundamentalismo ateu, tinha como um dos seus objectivos iniciais a total erradicação da religião[1]. Certamente todos nos lembramos da famosa frase de Marx onde trata a religião como "o ópio do povo"[2]. Carlos Chacal, o mais famoso de todos os terroristas - até Bin Laden ocupar esse trono - e Marxista-Leninista convicto, lutou na Jordânia e no Líbano integrado na PFLP (Popular Front for the Liberation of Palestine), assim como em raids na europa dos quais o mais famoso foi o ataque ao quartel general da OPEC em Viena, Áustria. E também o mesmo Chacal, em 2001 já preso em França, converteu-se ao Islão e escreveu dois anos depois um livro entitulado de "Islão Revolucionário"[3]. Na Palestina, as t-shirts de Che Guevara são comuns entre os jovens e este revolucionário argentino é visto como um herói quer entre os apoiantes da Fatah (seculares) como do Hamas (islâmicos).
Em Portugal, o PCP e BE são consistentemente pró-palestinianos enquanto o PSD e o CDS são inevitavelmente pró-israelitas. O PS comporta-se dependendo de estar no poder ou não.
O Partido Comunista Português, em nota do gabinete de imprensa em Setembro de 2011, anuncia que "apoia o reconhecimento da Palestina como Estado membro da ONU" e deixa bem explícito que as fronteiras devem ser as reconhecidas antes de 1967 e com Jerusalém leste como sua capital. Se até aqui esta nota poderia parecer uma simples e directa posição pela solução de dois estados, mais à frente encontramos verdadeiros juízos de valor ao estilo "bons vs maus"[4]:
Assim, o PCP exige do governo português (...) um inequívoco posicionamento no Conselho de Segurança, na Assembleia Geral da ONU, bem como no seio das Instituições Europeias em que participa, de apoio a esta legítima reivindicação do povo palestiniano, sucessivamente negada quer pela hipocrisia da chamada "comunidade internacional" quer pela criminosa acção do Estado israelita.
Cerca de um mês antes, o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda entrega um documento muitíssimo bem escrito (e muito menos emocional do que o do PCP)na Assembleia da República, onde recomenda ao governo o reconhecimento do estado palestiniano[5]. O documento realça o grande número de países que já reconheceram a Palestina e explica os motivos do seu apoio incluindo as várias resoluções das Nações Unidas, a violação sistemática e deliberada dos direitos humanos nos territórios ocupados e a barreira de segurança, cujo Tribunal Internacional de Justiça já condenou em 2003. A posição do BE não é tão radical como a do PCP já que evita totalmente os juízos de valor e procura fundamentar a sua recomendação em resoluções da ONU, nas suas leis fundamentais, nos direitos humanos e na posição da comunidade internacional.
O Partido Socialista mantém a sua rota sinuosa dependendo da sua posição dentro ou fora do governo. No final de 2011 (já fora do governo), critica a posição do governo português (PSD/PP) por se ter abstido na votação sobre a adesão Palestina a UNESCO por "considerar que ela diverge da orientação seguida nos últimos anos pelo país em relação ao Médio Oriente"[6]. No entanto, uns meses antes (quando José Sócrates era ainda chefe de governo), juntou-se ao PSD para rejeitar as propostas de reconhecimento do estado da Palestina (propostas redigidas pelo PCP, BE e PEV) e até escrevendo um texto conjunto com PS/PSD. Ou seja, quando no poder, submete-se à realpolitik da diplomacia internacional ficando refém dos seus aliados mais poderosos[7]. Esta lógica bovina ficou patente quando o deputado socialista Paulo Pisco utilizou o argumento de que "nenhum estado, enquanto membro da UE reconheceu o estado palestiniano"[8].
Os Sociais-Democratas e os Democratas Cristãos, por seu lado, mantém um discurso mais ou menos coerente na sua incoerência. Apoiam a existência de um estado palestiniano mas "Antes do reconhecimento do estado importa criar as bases desse mesmo estado" ou "Aderimos à ideia do Estado da Palestina como um factor de paz e não como mais uma acha para a guerra"[9]. Embora a ignorância de grande parte dos nossos parlamentares seja reconhecida e merecida, suspeito que terão alguma noção de que não é fácil criar as bases de um estado quando as prisões são bombardeadas por Israel[10], os deputados parlamentares eleitos democraticamente tomados reféns pelo IDF[11], as estradas são cortadas por centenas de check points[12], os aeroportos destruídos[13] e centenas de milhares de colonos judeus são colocados a viver em território ocupado na Cisjordânia[14]. Não é preciso ser especialista para ter alguma ideia do que se está a passar.
Só para efeitos de comparação, não ouvimos este tipo de discurso quando se tratou da independência de Timor-Leste. Nessa altura, não existia nem esquerda nem direita, nem da criação das bases do estado antes de existir um estado, nem o risco de se tornar uma acha para a guerra. Apenas direitos humanos. E é só disto que se trata.
Curiosa esta tua entrada! Parabéns! Ainda no mês passado vi um documentário bem interessante sobre novo grupo de pressão judeu nos Estados Unidos, J Street. Um novo alinhamento fora dos tradicionais e gigantescos lobbys pró-israel dentro do senado. Pela primeira vez um lobby judeu a defender o fim dos colonatos, a visitar a palestina e querer trabalhar nos dois lados. Resultado? Foram expulsos de israel
ResponderEliminarAbraço Toninho
Luis Allegro
http://jstreet.org/
ResponderEliminardo mesmo anónimo
Olá Luís
EliminarNice to have you here :)
Eu tenho visto alguma coisa sobre esses tipos do JStreet. Admiro-lhes a coragem e fico muito feliz porque são a prova viva de que ser contra determinadas atitudes do governo de Israel não significa ser anti-semita. Para além disso, quando comparados com o grande lóbi - AIPAC - é como o início da primavera depois de um longo inverno.
Não têm a capacidade financeira nem social da AIPAC, mas pelo menos causam a dúvida entre (principalmente) o congresso americano, que tem tido um comportamento deplorável em tudo o que toca à questão israelo-palestiniana. Para além disso, suspeito que a esmagadora maioria dos judeus americanos (e não só) não apoia a continuação de colonatos na Cisjordânia nem esta manutenção de um estado de guerra ou de inimizade com os vizinhos do Médio Oriente.
Entretanto estou a acabar de ler um livro - precisamente sobre o Lóbi de Israel nos EUA. Devo colocar aqui o book review no início da próxima semana.
Obrigado pelo apoio.
Abraços
1. Quando é que o país foi fundado e por quem?
ResponderEliminar2. Quais foram as suas fronteiras?
3. Qual foi a sua capital?
4. Quais foram as suas cidades mais importantes?
5. Quais foram as bases de sua economia?
6. Qual foi a sua forma de governo?
7. Pode citar pelo menos um líder palestino antes de Arafat?
8. A Palestina alguma vez foi reconhecida como um país cuja existência, então ou agora, não deixa margem a interpretação?
9. O que era a língua da Palestina?
10. Qual era a religião predominante da Palestina?
11. Qual era o nome de sua moeda? Escolha uma data qualquer na história e diga qual era a taxa de câmbio da moeda palestiniana em relação ao dólar dos EUA, ao marco alemão, à libra esterlina, ao iene japonês ou ao yuan chinês na referida data.
12. E, finalmente, dado que este país não existe actualmente, que é o que causou o seu desaparecimento e quando é que ocorreu? Você que lamenta o "afundamento" de uma orgulhosa e nobre nação ", diga s.f.f, quando exactamente é que essa "nação" era orgulhosa e nobre?
Para desmontar a propaganda antissemita deste indivíduo visitar por exemplo http://paliestine.com/. para se entender a magnitude do terrorismo islâmico que ele branqueia, p. ex. www.thereligionofpeace.com, ou www.jihadwatch.org.
Checkpoints é mau???
Dava-lhe jeito mais israelitas assassinados, não dava?
https://www.youtube.com/watch?v=WrWYpBZ5k6g
Pois na futura «Palestina», que Israel é o único país empenhado em criar (e já deu território muito superior ao seu actual para isso), já foi anunciado que não entrará um único judeu.
A quem se sinta tentado a deixar-se levar pelo antissemitismo raivoso desta criatura, aconselho ESTUDO da História.
Podem começar por aqui:
http://www.youtube.com/watch?v=gcTbWOHxcFU
E por aqui:
http://www.youtube.com/watch?v=63hTOaRu7h4
I.B.
Estes seus copy pastes não parecem acrescentar muito à discussão por isso vou responder apenas à parte que se deu ao te realmente escrever.
EliminarCertamente não me ouviu a desejar a morte a israelitas ou a qualquer outra pessoa. Esse ódio não faz parte de mim. E choro a morte de uma criança israelita da mesma forma que uma palestiniana. E considero um crime de guerra e um crime contra a humanidade uma foguete atirado contra civis quer tenha sido lançado pelas brigadas de Al Aqsa ou pelo IDF.
Não diga disparates sobre a "não entrará um único judeu". Os judeus só não entrarão na Palestina se não quiserem ou se o governo israelita os impedir.
No dia em que lá for vai ver. Actualmente não lhe será feita uma pergunta do lado dos Palestinianos.
Sobre "antisemitismo raivoso desta criatura", suspeito que estará a falar - erradamente - de mim. Longe disso. Não desejo mal a ninguém. E especialmente a um povo que tanto sofreu com ódios e preconceitos. Mas isso não lhe dá o direito de cometer crimes contra outros povos. E já agora, se um dia tiver vontade de cá voltar, gostava que fizesse uma dissertação sobre as diferenças entre anti-semitismo e islamofobia.
Os melhores cumprimentos,
António
PS: Prometo que arranjarei tempo para ver as peças que me enviou.
É mesmo, esta questão é muito esquerda/direita quando se trata apenas de direitos humanos ou direito à liberdade. Os mesmos direitos que me levam a detestar fundamentalistas de qualquer espécie, islâmicos e (tantos) outros.
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