sábado, 2 de junho de 2012

Hans Blix, Irão e Coreia do Norte

Hans Blix e Mohamed ElBaradei
Numa entrevista à cadeia de televisão russa Russia Today, que emite em inglês, Hans Blix, antigo director da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) comenta em dezembro de 2011 uma série de assuntos actuais relativos à proliferação nuclear, com particular destaque para o Irão e Coreia do Norte.

Já aqui escrevi anteriormente sobre o relatório da AIEA de 18 de Novembro de 2011 [1] que é bastante crítico do Irão e que foi utilizado por muitos como prova cabal de que o Irão está a produzir uma bomba nuclear. Falei de um deles, Itamar Rabinovich, em fevereiro, depois de este antigo embaixador de Israel nos Estados Unidos ter publicado um artigo no jornal "O Público" com o título "A globalização da ameaça nuclear iraniana" onde defendia que a finalização de uma bomba nuclear iraniana estaria iminente [2]. Muitos outros, quer em Israel (nomeadamente ligados ao partido Likud de Benjamin Netanyahu) quer nos Estados Unidos seguiram a mesma linha de raciocínio.

Não foi a leitura que fiz do relatório de 19 de Novembro, e pelos vistos não sou o único. Hans Blix, um diplomata sueco que dedicou grande parte das últimas décadas aos problemas nucleares do mundo é referenciado regularmente nas páginas deste blog. Entre outras missões, acompanha Mohamed ElBaradei nas missões da ONU para procurar armas de destruição massiva no Iraque em 2003 e ajudou a União Soviética no evento do desastre nuclear de Chernobyl em 1986.

Sobre este relatório, Blix afirma que continuam a não existir provas, e que as constantes ameaças feitas por Israel e Estados Unidos só conseguem piorar a situação e reafirma a necessidade de acalmar os animos em ambos os lados. Avisa ainda que o aumento contínuo da capacidade de enriquecimento de urânio por parte dos iranianos está a colocar uma pressão tremenda na diplomacia internacional e que estes deveriam ter em conta esses efeitos na normalização das relações diplomáticas entre o Irão e o mundo ocidental.

Em relação a Newt Gingrich relembra as palavras deste ex-candidato às primárias do Partido Republicano, onde ele ameaça com uma mudança de regime no Irão. Blix pergunta ironicamente, se Gingrich pretende uma mudança usando o modelo iraquiano ou o modelo afegão. Este ex-candidato já tinha mostrado anteriormente os seus vastos conhecimentos sobre o médio oriente e a sua posição sobre este quando conseguiu no espaço de semanas referir-se aos palestinianos como "um povo inventado" e depois reduzindo-os a "essa gente [os palestinianos] são terroristas"

A parte mais relevante da entrevista, na minha opinião, refere-se à necessidade de criar um "Nuclear Weapons Free Middle East", i.e. nenhum país do médio oriente ter armas nucleares. Uma solução deste tipo pode tocar um pouco nos possíveis objectivos do Irão, mas é acima de tudo uma lembrança a Israel de que ninguém se esqueceu das ogivas nucleares na sua posse. Não podem exigir aos outros que não as tenham enquanto as guardam para qualquer eventualidade. As armas nucleares israelitas são precisamente o motivo porque o Irão poderia querer ter uma(s). Para procurar um equilíbrio do estilo MAD (Mutual Assured Destruction) semelhante ao que os Estados Unidos e a União Soviética tiveram durante quase meio século. Por outro lado, se o Irão conseguisse efectivamente construir uma, todos os estados árabes do golfo iriam procurar obtê-las também, para se poderem defender de uma possível ameaça do outro lado do golfo. Esta corrida ao armamento é incrivelmente perigosa, em especial quando esta região está numa instabilidade acrescida devido à Primavera Árabe.

Blix analisa também a mudança de liderança na Coreia do Norte e realça a importância de não provocar este país num momento em que o regime se encontra particularmente agitado. 

6 comentários:

  1. Boa Tarde

    Médio Oriente sem armas nucleares, esse sempre foi o caminho mais lógico que devia seguir, mas o Estado de Israel, têm sido um péssimo exemplo no que diz respeito para com os seus paises vizinhos, eles já envadiram quase todos, e sempre ganharam e graças a isso, esses mesmos paises que foram derrotados para não dizer humilhados em algumas circuntancias, levaram consigo um sentimento de revolta, impotência e MEDO.

    Esse medo gerou uma corrida armamentista nunca antes ocorrida no Médio Oriente, depois é normal que saiam da boca para fora frases do género ''Israel must be wiped off the map'' (Israel deve ser ''varrido'' do mapa) da parte de Mahmoud Ahmadinejad.

    Estado de Israel continua a fazer se de menino bonito, mas o holocasto já foi à muito tempo, hoje em dia o que se passa é o seguinte, Israel teme pelo pior, teme que deixe ser a potencia nº1 do Médio Oriente, porque sabe que que amigos nas redondesas não os têm, assim como a América teme perder Israel, aliado importantissímo no Médio Oriente.

    O desarmamento não só de Israel mas também do Paquistão seria o suficiente para dialogar na maior das calmas com ambas as partes, acho que resolvia uma boa parte do conflito de ''Guerra Fria'' que se vive na região, acabaria com o muro que divide a Palestina do Estado de Israel, bem como iniciar uma diplomacia séria com o Irão.

    Atenção não estou a defender ninguém muito o menos Irão, apenas me refiro à memória histórica, no qual o Estado de Israel teve um péssimo comportamento, se caso pensar que estou a defender alguém em concreto, peço imensa desculpa pois não foi minha intenção.

    Cumprimento e continuação de um bom trabalho.

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    1. Boa Tarde

      Concordo com a generalidade do que diz, embora existam alguns pontos em que tenho uma opinião um pouco diferente.

      Israel tem, de facto, saído vitorioso de grande parte dos conflitos em que se viu envolvido, nomeadamente a guerra da independência, em 1946, e a guerra dos 6 dias em 1967. No entanto não foi sempre bem sucedido. À conquista do Sinai o Egipto respondeu com um ataque formidável (militar e diplomático) que forçou Israel a regressar ao ponto de origem. A travessia do Suez foi um dos maiores feitos da história militar moderna do Egipto. As invasões do Líbano foram - todas elas - fracassos absolutos. Nuns casos levaram a um atoleiro que custou muitas vidas a Israel sem quaisquer ganhos associados, noutros a operações de Blitzkrieg mal calculadas a que o Hizbullah respondeu sempre com mestria tática e perseverança.

      Mas existe de facto uma corrida ao armamento no Médio Oriente, causado quer por Israel quer pelo Irão. E os ricos estados do golfo (Arábia Saudita, EAU, Qatar, Kuwait, Oman, etc.) estão a gastar somas inacreditáveis para modernizar as suas forças e em alguns casos a contratar mesmo exércitos de mercenários. Mas se esta escalada é perigosa, será muito mais se se tornar nuclear. Lembro-me de há dois anos a Arábia Saudita ter feito de uma só vez uma compra de 50 mil milhões de dólares e os EAU de 16 mil milhões. Se pensar que em Portugal foi um drama a compra de 2 submarinos no espaço de uma década por um valor abaixo de mil milhões de euros, dá para ficar com uma ideia da dimensão do problema na região.

      O desarmamento do Paquistão teria sempre que ser feito em conjunto com a Índia. Não podemos pedir que um destrua o seu armamento sem que o outro acompanhe, ou arriscava-se a quebrar o equilíbrio existente que, com todos os seus defeitos, tem conseguido evitar nova guerra entre os dois. Algo semelhante ao programa START entre os EUA e a Rússia poderia ser adequado.

      Um ponto que discordo é de que a redução do armamento nuclear israelita teria impacto na Palestina. Embora seja um movimento que eu apoie e que tornaria a região como um todo bastante mais segura, não me parece que teria qualquer impacto já que a ocupação continuaria a existir. Essa solução terá que ser resolvida à parte.

      Os melhores cumprimentos,

      António

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  2. Boa Tarde

    Antes demais discordo consigo em algumas coisas, a começar com a guerra com o egipto, apesar da derrota, não foi uma derrota pesadíssima foi uma derrota normal, (a meu ver não houve derrota militar para o Estado de Israel)repare agora:

    1º As fronteiras sob controle ficaram maiores para o Estado de Irael, e incluíam as Colinas de Golã (controle dividido com os sírios), e a Península do Sinai com controle dividido com os egípcios (ou seja a tentativa não foi em vão), o Estado de Israel perdeu os territórios anexados por vias diplomáticas, quer as Colinas de Golã ( hoje controladas por Sírios e a ONU) como a Península do Sinai.

    2º O material militar da palestina ficou destruido quase na sua totalidade.

    3º A grandes parte das perdas foram muito maiores com para egipticíos e palestinianos.

    Ou seja o desfecho desta guerra favoreceu claramente o Estado de Israel, mesmo cedendo (não perdendo militarmente) a parte ''deles'' da Penisula de Sinai, e as Colinas de Golã o Estado de Israel impõe se como definitivo como a potência militar da região do Médio Oriente.

    Quanto ao investimento militar da Arábia Saudita, não é de 50 Mil Milhões, mas sim de 60 Mil Milhões, embora ao principio só se tivesse assinado um acordo de 47 Mil Milhões de dolares eu estou a par quase sempre desse tipo de grandes tranferencias, o orçamento foi aumentado porque também quis modernizar a marinha, mas isso não quer dizer que fiquei com um material de alta qualidade:

    1º Vão comprar 150 aviões a jacto F-35, preço base de uma unidade 236 Milhões sem a tecnologia para melhorar, se caso quiser o preço subira, o preço irá rondar 295 Milhões (estou falar me Dollar), só os aviões ficaram a rondar os 35 Mil Milhoes,
    e fragatas de guerra, bem como artilharia anti-area (não quantas unidades), bem como metrelhadoras.

    Atenção o Arábia Saudita irá gastar mais de 10% do PIB durante uns bons anos, e outra coisa não terá acesso a tecnologia como o resto dos paises da aliança da NATO, por ex. Portugal comprou 20 em 1994 (mas sem a melhor tecnologia)e em 2001 os EUA DERAM DE GRAÇA repito DERAM DE GRAÇA 20 caças F-16 (usados mas em bom estado) já ''hackeados'' com tecnologia de ponta, que tornava este caça tão bom como o F-35 (visto que utilizava a tecnologia do mesmo) e superior aos caças F-18 espanhóis, também foram ''hackeados'' os outros 20, podendo assim tem uma capacidade de resposta incluido lançar misseis de ogiva nuclear e outro tipos de misseis,(para quem não sabe nas bases militares dos Açores estas umas quantas) não sou eu que digo nem é inventado, intelegence estrangeira e a população local garante que sim.

    Obrigado pela atenção e peço desculpa se desviei o assunto no final do texto e continuação de um bom trabalho.

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    1. Meu Caro

      Não tem nada que pedir desculpa. Se eu não gostasse de ouvir opiniões diferentes da minha teria impedido os comentários. Pelo contrário, tenho gosto em discutir estes e outros assuntos e ser confrontado com os meus erros de análise quando isso acontecer.

      Pegando nos pontos que referiu:

      1. O Sinai não tem controlo dividido. Está nas mãos do Egipto. A única limitação é que concordaram no acordo final de paz com Israel - ainda em vigor - em não ter lá militares. Os montes Golan também não estão divididos, estão nas mãos dos israelitas. Vou procurar documentação que o comprove, mas tenho muito poucas dúvidas em relação a isto.

      2. De acordo.

      3. Também concordo. Existe no entanto uma questão relevante que é a sensibilidade às perdas, que é diferente. Israel perde guerras em que mata em proporções de 5 para 1. No entanto, o Hizbullah - por exemplo - apresenta-os como mártires pela sua causa e consegue encontrar mais voluntários para os substituirem. Os israelitas sofrem enormemente com isso, e cada vida judia perdida causa uma enorme preocupação no país. Existe uma organização (salvo erro as Mães de Israel) que praticamente manda governos abaixo quando não concorda com um ataque ou a forma como é feito.

      Agradeço mais uma vez os detalhes que enviou. Não tinha noção da qualidade que estes nossos F16 tinham, muito menos em termo de comparação com espanhois e outros. Sabia que Israel tinha pressionado os EUA para que as vendas feitas à Arábia Saudita não incluissem os topos-de-gama, mas não tinha a certeza se tinham sido bem sucedidos.

      Os melhores cumprimentos,

      António

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  3. Boa Tarde

    Eu disse o seguinte, que quando o Estado de Israel tentou anexar o Penisula de sinai, esta foi divida entre ambos os paises (durante a guerra até chegarem a um acordo), eu estava a falar durante o conflito, provavelmente eu é que não me expliquei da forma mais correcta.

    Quanto as Colinas de Golã tem total razão estão sobre dominio total do Estado de Israel, apesar da Síria estar sempre a reivindicar o território.

    Também é de salientar que EUA, e a União Europeia e Liga Arabe consideram que as Colinas de Golã ou montes de golan são território sírio ocupado pelo Estado de Israel.

    Obrigado pela atenção, e peço desculpa pela confusão que criada.

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    1. Boa Tarde

      Não se preocupe, nem tem que pedir desculpas por nada.

      Sobre os montes Golan, ando para escrever há algum tempo, em especial sobre aquela pérola da diplomacia militar chamada Sheba Farms. Um terreno minúsculo dentro dos montes Golan que a Síria aceitou como sendo libanês, de forma a que o Hizbullah consiga continuar a fingir que está em guerra aberta com Israel. Israel por seu lado não quer admitir qualquer derrota e diz que essa quinta é Síria e deverá ser discutida como parte integrante de um futuro acordo em relação aos montes Golan.

      É uma história curiosa: cada um dos lados tenta mostrar aos seus que continua numa luta contínua contra o adversário, mas mantendo as baixas mínimos para um terreno que não qualquer valor militar, económico ou religioso. No máximo, depois de tantos micro-confrontos pela sua dominação, terá algum valor simbólico.

      Os melhores cumprimentos,

      António

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